terça-feira, 3 de setembro de 2013

A Época de Ouro da Música Popular Brasileira



Por “Época de Ouro” da música brasileira, entende-se o período iniciado com a revolução da turma do Estácio, já falado neste trabalho, passando por Noel Rosa e outros compositores e artistas que apareceriam a partir dos anos 1930. Jairo Severiano considera o período 1929-1945 como tempo delimitador dessa Era que vê surgir um grande número de artistas talentosos de uma mesma geração, a geração de 30 (Severiano: 2008; pp. 107-111).

Participaram do início dessa geração compositores como Ary Barroso (1903-1964), Lamartine Babo (1904-1963). O primeiro, dedicado ao samba, foi também radialista e apresentador de programa de auditório de grande respeito e importância. Mineiro, mudou-se para o Rio de janeiro aos 18 anos e ali se radicou. Autor dos clássicos Aquarela do Brasil e Na Baixa do Sapateiro, foi um dos principais autores do gênero samba exaltação. O segundo, surgido também no final dos anos 1920 e, juntamente a João de Barro, se tornaria o fixador do gênero marcha. João de Barro ou Braguinha (Carlos Alberto Ferreira Braga, 1907-2006). Foi um dos compositores que mais se destacaram por sua grande produção, principalmente nas marchas carnavalescas. Como Noel, também integrou o Bando de Tangarás, iniciando em 1929 sua carreira (Idem: 2008; pp. 107-111).

Outros artistas como o melodista Joubert de Carvalho (1900-1977), Custódio Mesquita (1910-1945), André Filho (1906-1974), autor de Cidade maravilhosa, Alberto Ribeiro (1902-1971) autor de 85 músicas com João de Barro, também fazem parte deste contexto. O letrista Orestes Barbosa (1898-1966), autor das antológicas Chão de estrelas e Arranha-céu (canção e valsa, respectivamente), ambas em parceria com Silvio Caldas, de 1937, também contribui com o talento de sua poesia (Idem: 2008; pp. 107-111).

Grandes cantores se juntam a esses compositores. Mario Reis (1907-1981), ex-aluno de violão de Sinhô na década anterior, surge com um estilo diferente de cantar, explorando as novas possibilidades do microfone e da gravação elétrica. Seu canto coloquial e intimista marcou a época na qual sinônimo de bom cantor era aquele que possuía potência de voz e impostação (Idem: 2008; pp. 107-111).

Carmen Miranda (1908-1955), primeira cantora a alcançar grande sucesso nacional e que viria a se tornar a maior estrela da música brasileira no estrangeiro, surge no início desta década de 1930. É de janeiro deste ano seu disco de estréia. A Pequena Notável, como ficou conhecida, foi amiga dos grandes compositores da época, gravando praticamente todos eles. Na lista estão Ary Barroso (Na Baixa do Sapateiro), Lamartine Babo (Cantores do rádio c/ Aberto Ribeiro e João de Barro), Assis Valente (Camisa listrada), Dorival Caymmi (O que é que a baiana tem), João de Barro (Primavera no Rio), Sinval Silva (Adeus batucada), André Filho (Alô, alô), Zequinha de Abreu (Tico- tico no fubá), para citar um exemplo de cada. Se tornaria a Brazilian Bombshell de Hollyhood, chamando a atenção do mundo para a música do Brasil (Idem: 2008; pp. 107-111).

Neste mesmo início de ano, surge Silvio Caldas (1908-1998), o caboclinho querido, um dos ícones da seresta e que manteve uma longa carreira de mais de cinqüenta anos. Foi amigo de cantores como Orlando Silva, Mario Reis e Francisco Alves, formando com estes um seleto e respeitável grupo de estrelas da época; Almirante (Henrique Foreis Domingues, 1908-1980), cantor e amigo de Noel e Braguinha e depois produtor de rádio e pesquisador de música popular, sendo considerado a maior patente do rádio, por seu apelido de Almirante; Moreira da Silva (1902-2000) notabilizou-se como o maior intérprete do samba-de-breque. Seu nome é quase sinônimo deste gênero musical; o conjunto vocal Bando da Lua foi o pioneiro neste estilo, influenciando tantos outros que surgiriam. Liderado por Aloysio de Oliveira (que mais tarde seria um grande produtor musical, tendo trabalhado com João Gilberto e Tom Jobim entre outros da bossa-nova), o grupo acompanharia Carmen Miranda até o final de sua carreira. Com a morte de Carmen em1955, o grupo também se dissolveu (Idem: 2008; pp. 107-111).

Dentre os instrumentistas que surgiram ou já estavam atuando nesta época de ouro, destacam-se alguns como o grande pianista-compositor-arranjador Radamés Gnattali (1906-1988) que atuou nas áreas erudita e popular; o chorão, compositor e líder mais famoso regional da Era do Rádio, Benedito Lacerda (19031958), tendo sido o principal flautista de sua geração; o multiinstrumentista Garoto (Aníbal Augusto Sardinha, 1904-1987) detinha grande maestria nas cordas dedilhadas. Dominava como poucos o violão, o volão-tenor, o banjo, o bandolim, o cavaquinho e até a guitarra havaiana; completando este time, o bandolinista Luperce Miranda (1904-1977), chorão e compositor recifense (Idem: 2008; pp. 107-111).

Outros nomes da geração anterior também atuam, abrilhantando esta fase. Estão entre eles estão os cantores Francisco Alves, (o Rei da Voz, 1898-1952), Vicente Celestino (1894-1968), Patrício Teixeira (1893-1972), Aracy Cortes (19041985) e Paraguaçu (Roque Teixeira, 1884-1976); os músicos compositores Pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana, 1897-1973), Josué de Barros (1888-1954), Donga (Ernesto dos Santos, 18901974), João da Baiana (João Machado Guedes, 1887-1974), Zequinha de Abreu (José Gomes de Abreu, 1880-1935), Heitor dos Prazeres (1898-1968) e os letristas Luís Peixoto (1889-1973) e Olegário Mariano (1889-1958) (Idem: 2008; pp. 107-111).

Orlando Silva, o Cantor das multidões (1915-1978), reinou absoluto como sua bela voz no período de 1937 a 1942. Juntamente ao seu antecessor, amigo e iniciador Francisco Alves e também de Silvio Caldas, formava o seleto grupo de cantores. Seu aparecimento é contado por Jonas Vieira, seu biógrafo. O autor conta que Orlando foi apresentado a Chico Alves por Bororó (Alberto de Castro Simões da Silva, 1898-1986), o compositor do samba Da cor do pecado, que o levou ao Café Nice onde estava o cantor. Depois de tentar, sem sucesso, encaminhar Orlando a um amigo diretor da rádio Cajuti, disse a Orlando que o acompanhasse: 

“... Disse que ele seria ouvido naquele mesmo dia,
pelo Francisco Alves, que se encontrava naquela hora
no Café Nice. Fomos ao seu encontro, Chico estava
com vários amigos na mesa, entre eles Antônio
Nássara, Orestes Barbosa, Ewaldo Rui, Eratóstenes
Frazão, Germano Augusto, Kid Pepe, Rubens Soares,
além de outros que não me lembro mais. Pedi ao
Chico para ir lá fora ouvir um rapaz que acabara de
me impressionar e ele prometeu que sairia em
seguida. Juntei-me outra vez a Orlando e, logo
depois, vieram Chico e quase todos aqueles nomes
que citei. Fiz a apresentação e o grupo saiu em
direção à rua Chile (...) O resto, todo mundo sabe. A
ascensão meteórica do Orlando, como nenhum outro
cantor, realmente incomparável em voz e
interpretação. Ninguém foi igual a ele” (Vieira: 2004;
pp. 65-66).

Ainda nomes como o de Herivelton Martins (1912-1992), Wilson Batista (1913-1968), Ataulfo Alves (1909-1969), Haroldo Lobo (1910-1965), Roberto Martins (1909-1992), Mario Lago (1911-2002) e Geraldo Pereira (1918-1955) entre tantos outros, só para citar os mais famosos, dão o tom do que foi essa época maravilhosa da música popular brasileira e, sobretudo, do samba. 

Durante toda a década de 1930, cerca de 32% do repertório gravado foi de sambas. Marca importante que mostra que o povo brasileiro assimilou este gênero musical rapidamente, minimizando assim, a influência do maxixe. Jairo Severiano considera que os maiores autores de samba da Época de Ouro, considerando os que optaram “como meio preferido de expressão” apenas este ritmo, são: Ismael Silva, Alcebíades Barcelos, Nilton Bastos, Armando Marçal, Ary Barroso, Noel Rosa, Wilson Batista, Ataulfo Alves e Geraldo Pereira. São deles verdadeiras obras-primas como Se você jurar, (de Ismael Silva, Nilton Bastos e Francisco Alves, 1931), Para me livrar do mal (de Ismael Silva e Noel Rosa, 1932), Faceira e Morena boca de ouro (de Ary Barroso, 1931 e 1941), Com que Roupa e Último desejo (de Noel Rosa, 1931 e 1937), Agora é cinza e A primeira vez (de Alcebíades Barcelos e Armando Marçal, 1934 e 1940), O bonde de São Januário (de Wilson Batista e Ataulfo Alves, 1941), Emília (de Wilson Batista e Haroldo Lobo, 1942), Ai que saudades da Amélia (de Ataulfo Alves e Mario Lago, 1942) e Falsa Baiana (de Geraldo Pereira, 1944) (Severiano: 2008; pp. 173-174).

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SEVERIANO, Jairo. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. São Paulo: Editora 34, 2008.

VIEIRA, Jonas. Orlando Silva, o cantor das multidões. 3ª ed. Rio

de Janeiro: FUNARTE, 2004.


(Monografia - parte) “SAMBA E MODERNIDADE - O samba como agente transformador na primeira metade do século XX” de 2010, de Francisco de Assis Furriel Gonçalves)


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