Sobre o “Festival de 75”, tenho algumas lembranças, quase todas bem fragmentadas por conta do tempo que se passou e também pela pouca idade que tinha na época. Aconteceu na Escola João de Camargo em dezembro de 1975. A escola já tinha por prática a elaboração de eventos artísticos, incentivando os alunos a desenvolverem seus talentos. Era comum a realização de peças de teatro, as exposições de artes plásticas etc. Porém, este festival de música foi especialíssimo para mim. Foi por causa deste evento que decidi, a todo custo, estudar ali.
A emoção de ouvir o coro do público cantando o refrão de “Eu quero o meu enredo” acompanhando o Sergio Cesar Rosa, não tinha preço. O Sergio era bem carismático e sabia que o samba ia pegar. A música tinha sido composta por mim e pelo Ronaldo Alves, meu primeiro e melhor amigo. Lembro-me bem que quando saiu o resultado final da vitória, Ronaldo e eu nos abraçamos e, se não estou enganado, chegamos às lágrimas. Afinal, era muita história resumida ali, naquele momento do grito de “é campeão!”. Recordo-me que tinha um pessoal por perto de nós que não entendia nada, pois para todos, o samba era do próprio Sergio. Era uma exigência da Escola que as músicas inscritas fossem de autoria dos alunos e naquela época, Ronaldo e eu ainda não éramos alunos da João de Camargo. Ao mesmo tempo em que nos abraçávamos, éramos abraçados por outros como Sandra Alves, Wagner Aves (irmãos do Ronaldo) e Malvina Fernandes, todos reunidos dentro da biblioteca que ficava ao lado do local onde estava o palco. Aliás, o palco era apenas uma mesa grande e alta, sobre a qual os “meninos” se apresentavam. Na apresentação de “Primavera”, canção de Deise Cordeiro que tirou o terceiro lugar (segundo a própria Deise, 2º lugar em melodia (?)), tinha tanta gente sobre o “palco” que não sei como não houve um acidente. Achei fantástica essa apresentação, pois tinha violão, flauta entre outros instrumentos, além da voz da Deise, é claro.
Várias músicas apresentadas no festival daquele ano marcaram o momento. Embora não consiga lembrar de todas inteiramente, seria possível fazer um retrato daquele tempo através do recorte das músicas. Uma falava do Metrô que estava tendo a sua construção iniciada. Falava-se de como era difícil conviver com tanto barulho e tantos buracos pela cidade: “Metrô está aí fora/ Furando tudo que é lugar/ Vou me mudar daqui agora/ Dessa maneira não dá mais pra agüentar”. Outra falava de rock, uma outra de desenho animado, uma outra ainda, falava da superstição da sexta-feira 13: “Sexta-feira 13, Sexta-feira 13 é/ Sexta-feira 13 consagrado o dia do azar...”. Infelizmente não me lembro dos autores.
No entanto, a minha música preferida foi e é até hoje o samba da Terezinha Pinto que falava da partida inevitável e da necessidade de olhar o futuro com confiança, sem ilusões: “Quando eu partir/ Não quero choro/ Somente o meu tamborim/ Minha cuíca e um pedaço de madeira/ Pra quando estiver de bobeira/ Eu vou cantar meu samba assim/ Chorar pra quê, pra quê chorar, o que passou nunca mais irá voltar...”
Parte dessa moçada encontrou-se recentemente para uma confraternização, após mais de 30 anos. É a força da memória afetiva.