quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Lembranças de um Festival


     Sobre o “Festival de 75”, tenho algumas lembranças, quase todas bem fragmentadas por conta do tempo que se passou e também pela pouca idade que tinha na época. Aconteceu na Escola João de Camargo em dezembro de 1975. A escola já tinha por prática a elaboração de eventos artísticos, incentivando os alunos a desenvolverem seus talentos. Era comum a realização de peças de teatro, as exposições de artes plásticas etc. Porém, este festival de música foi especialíssimo para mim. Foi por causa deste evento que decidi, a todo custo, estudar ali.

     A emoção de ouvir o coro do público cantando o refrão de “Eu quero o meu enredo” acompanhando o Sergio Cesar Rosa, não tinha preço. O Sergio era bem carismático e sabia que o samba ia pegar. A música tinha sido composta por mim e pelo Ronaldo Alves, meu primeiro e melhor amigo. Lembro-me bem que quando saiu o resultado final da vitória, Ronaldo e eu nos abraçamos e, se não estou enganado, chegamos às lágrimas. Afinal, era muita história resumida ali, naquele momento do grito de “é campeão!”. Recordo-me que tinha um pessoal por perto de nós que não entendia nada, pois para todos, o samba era do próprio Sergio. Era uma exigência da Escola que as músicas inscritas fossem de autoria dos alunos e naquela época, Ronaldo e eu ainda não éramos alunos da João de Camargo. Ao mesmo tempo em que nos abraçávamos, éramos abraçados por outros como Sandra Alves, Wagner Aves (irmãos do Ronaldo) e Malvina Fernandes, todos reunidos dentro da biblioteca que ficava ao lado do local onde estava o palco. Aliás, o palco era apenas uma mesa grande e alta, sobre a qual os “meninos” se apresentavam. Na apresentação de “Primavera”, canção de Deise Cordeiro que tirou o terceiro lugar (segundo a própria Deise, 2º lugar em melodia (?)), tinha tanta gente sobre o “palco” que não sei como não houve um acidente. Achei fantástica essa apresentação, pois tinha violão, flauta entre outros instrumentos, além da voz da Deise, é claro.

     Várias músicas apresentadas no festival daquele ano marcaram o momento. Embora não consiga lembrar de todas inteiramente, seria possível fazer um retrato daquele tempo através do recorte das músicas. Uma falava do Metrô que estava tendo a sua construção iniciada. Falava-se de como era difícil conviver com tanto barulho e tantos buracos pela cidade: “Metrô está aí fora/ Furando tudo que é lugar/ Vou me mudar daqui agora/ Dessa maneira não dá mais pra agüentar”. Outra falava de rock, uma outra de desenho animado, uma outra ainda, falava da superstição da sexta-feira 13: “Sexta-feira 13, Sexta-feira 13 é/ Sexta-feira 13 consagrado o dia do azar...”. Infelizmente não me lembro dos autores.

     No entanto, a minha música preferida foi e é até hoje o samba da Terezinha Pinto que falava da partida inevitável e da necessidade de olhar o futuro com confiança, sem ilusões: “Quando eu partir/ Não quero choro/ Somente o meu tamborim/ Minha cuíca e um pedaço de madeira/ Pra quando estiver de bobeira/ Eu vou cantar meu samba assim/ Chorar pra quê, pra quê chorar, o que passou nunca mais irá voltar...”

     Parte dessa moçada encontrou-se recentemente para uma confraternização, após mais de 30 anos. É a força da memória afetiva.



segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

A tolerância é uma virtude especificamente ocidental?

Comentário sobre o texto de Amartya Sen, “Cultura e direitos humanos”, quanto a alegação de que a tolerância é uma virtude especificamente ocidental.


A alegação de que a tolerância é uma virtude especificamente ocidental tem sua origem no pensamento ocidental e moderno. O autor defende a todo tempo a relativização dessa tese, defendendo que nem sempre o ocidente teve tolerância. Quando fala da tolerância islâmica (p. 273), Sen cita o imperador mongol Akbar, que reinou na Índia entre 1556 e 1605 e promovia a tolerância quanto às diversas formas de comportamento social e religioso, como liberdade de culto e a prática religiosa que não seriam, segundo ele, facilmente tolerados em partes da Europa naquela época. Enquanto “as inquisições estavam em pleno vapor na Europa”, Akbar fazia pronunciamentos e decretos como o citado no texto[1]. Amartya Sen considera que a valorização da liberdade não se limita a uma só cultura e que o pensamento social baseado na liberdade não é de propriedade das tradições ocidentais.

Na verdade, o autor busca o entendimento das distintas visões de mundo, analisando também o outro lado. Quando indagado por um crítico sobre onde encontrar na história asiática uma equivalência ao que se considera uma notável história de ceticismo, ateísmo e livre pensar ocidental, o autor diz que não é difícil encontrar. Ele cita, no caso da Índia, as escolas ateístas de Carvaka e Lokayata, bem anteriores à era cristã, cuja literatura ateísta foi duradoura, influente e vasta. Amartya defende que apesar das constantes violações da tolerância por toda parte em qualquer cultura, persistentemente, vozes em favor da liberdade se levantam de todas as formas, em culturas distintas e distantes.


 “Nenhum homem deve ser incomodado por motivos de religião, devendo-se permitir a qualquer um mudar para a religião que lhe aprouver. Se hindu, quando criança ou em outra época de sua vida, houver sido feito muçulmano contra a sua vontade, deve-se permitir que ele retorne, se assim o desejar, à religião de seus antepassados” (p. 274).



Questão trabalhada na aula de Direitos Humanos (Tema Transversal) - 2º semestre de 2010

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A poesia e o universo feminino

Outro dia estava pensando sobre a poesia e sobre o talento que os poetas têm de imaginar situações, sensações e sentimentos, inventando um mundo paralelo, no qual tudo é possível. Pensei na surpresa que alguns poemas nos causam pela originalidade.

O poema “Nas ruas” de Eliana Pichinine é um exemplo disso. Nele, Pichinine pressupõe ficar no espaço mínimo, entre as pedras portuguesas, os amores interrompidos. Seu curto poema resume uma imensidão de possibilidades de interpretação:


“Des(gastei) a solidão
andando
Nos contornos
das pedras portuguesas
teimavam as lembranças
de tropeços enamorados”

A imagem é bacana, pois o tropeço supõe a interrupção de um andar, consequentemente, a interrupçao de um objetivo. Somente uma mulher ou um poeta poderia parar para pensar em como e o quanto as pedras portuguesas podem reter do universo feminino. Na infinidade dos inúmeros tropeços, com seus altíssimos saltos, a mulher acaba por deixar naqueles espaços dores, revoltas, descuidos e, por que não, amores trôpegos. Fica a dor do tropeço como também a dor de amor. Um homem não pensaria em sentimentos deixados entre as lusas pedras. Não veria necessidade. Essas não nos dizem nada de especial, além de comporem, no imenso calçadão, as ondas da praia mais famosa do mundo.

Outro exemplo ímpar de imaginação poética é a música de Gilberto Gil, “Entre a sola e o salto”, gravada por Alcione no LP “Alerta Geral” de 1978. O compositor consegue imaginar o mundo e a imensidão no espaço entre a sola e o salto da mulher, provavelmente de tão alto que é. O gênio de Gil consegue ver ali naquele vão um abrigo contra o orgulho da ilusão, um espaço tão grande que cabe um coração. A visão de Gilberto Gil remete a um certo fetiche, fazendo do espaço singular um lugar de aconchego.


Entre a sola e o salto (Gilberto Gil)

Vê/ Por aquela janela/ Entre a sola e o salto do sapato alto dela/ Vê/ Por ali, pelo vão/ Entre a sola, o salto do sapato alto dela e o chão/

Vê/ Como existe um abrigo/ Entre a sola e o salto do sapato alto/ Contra o perigo do orgulho, da ilusão/ Basta um centímetro prum grande coração/ No espaço, ali embaixo/ Entre a sola e o salto existe a imensidão/

Vê/ Como cabe folgada/ A imensidão do olhar numa nesga de chão/ Num pedaço de calçada/

Vê/ Que há bastante lugar/ Prum coração chegar ali, ficar ali/ Passar dali pra acolá/

Ê, ê, quanto amor/ No espaço embaixo do sapato dela/ Ê, ê, quanto amor/ No abrigo embaixo do sapato dela/ Ê, ê, quanto amor/ No teto embaixo do sapato dela/ Ê, ê, quanto amor/ Na tenda embaixo do sapato dela/



Veja o vídeo de "Entre a sola e o salto"
Leia o poema "Nas ruas"

.

Palavras que brotam

O Sol me aqueceu na medida certa

A chuva molhou as boas e as más lembranças

O amor inspirou-me de todo

Então, elas vieram

De todo jeito, de toda forma, chegaram, romperam

Brotaram as palavras


                                                              por Assis Furriel




Homenagem ao novo blog de minha amiga Katia.

Bem-vinda à bloguesfera!

domingo, 19 de dezembro de 2010

Autopsicografia 2

  
O historiador é um fingidor (Eu sou)

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é história

A história que deveras mente (Eu minto)

Por Assis Furriel



Paródia do poema “Autopsicografia” de Fernando Pessoa


(Uma provocação e uma proposta de reflexão sobre a missão do historiador junto ao seu objeto de estudo)

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A poesia de Adélia Prado III

Ensinamento

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.



Módulo de Verão

As cigarras começaram de novo, brutas e brutas.
Nem um pouco delicadas as cigarras são.
Esguicham atarraxadas nos troncos
o vidro moído de seus peitos, todo ele
(chamado canto) cinzento-seco, garra
de pêlo, arame, um áspero metal.
As cigarras têm cabeça de noiva,
as asas como véu, translúcidas.
As cigarras têm o que fazer,
têm olhos perdoáveis.
- Quem não quis junto deles uma agulha??
- Filhinho meu, vem comer,
ó meu amor, vem dormir.
Que noite tão clara e quente,
ó vida breve e boa!
A cigarra atrela as patas
é no meu coração.
O que ela fica gritando eu não entendo,
sei que é pura esperança.


(Do livro Bagagem, 1976)


sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Rosinha, minha canoa




A história de José Mauro de Vasconcelos de 1962 fala da relação mágica de Zé Orocó e sua canoa Rosinha. O autor de "Meu pé de laranja lima" transporta-nos a um universo mágico da floresta e nos faz refletir sobre essa natureza das matas e dos bichos. O capítulo "Olhos Vegetais" é um hino de amor à natureza. Nele, José Mauro conta o surgimento da canoa. A partir da história do nascimento e da vida de uma canjirana-branca, narrada pela própria Rosinha ao seu dono Orocó, o autor revela o desejo de um velho landi em transformar-se numa canoa a serviço dos índios. É simplesmente lindo e emocionante.

Devo a apresentação desse livro ao meu amigo Valtair que me indicou, emocionado (romântico como era) a beleza dessa obra. Valtair não está mais entre nós fisicamente, mas deixou lembranças de grandes momentos como esse.  Cheia de lirismo e encanto, essa história me marcou muito.

Esta indicação é muito em sua homenagem.



quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

O disco do Blog

BICICLETA


01 - Um Canto de Trabalho (Nelson Ângelo / Cacaso)
02 - As Moças (Zé Renato / Juca Filho)
03 - Correnteza (Tom Jobim / Luis Bonfá) with Antonio Carlos Jobim
04 - Neném (Maurício Maestro)
05 - Porto Seguro (David Tygel / Márcio Borges)
06 - Bicicleta (Zé Renato)
07 - Saci (Paulo Jobim / Ronaldo Bastos) with Antonio Carlos Jobim
08 - Passarinho (Lourenço Baeta)
09 - "Boi do Maranhão" - Urrou do Boi (Tradicional) - Boi do Pindaré (Tradicional) - Boi Danado (Sergio Habibe)
10 - Arado (Dalmo Medeiros)
11 - Nossa Dança (Danilo Caymmi / Ana Terra)

O disco faz vinte anos e é um clássico da música brasileira e, como o primeiro do grupo, marcou uma época. "Bicicleta" é uma obra de arte vocal.


O Boca:

David Tygel
(viola, violao, vocal)
Jose Renato
(violao, vocal)
Mauricio Maestro
(bass, violao, viola, vocal, instrumental and vocal arrangements)
Lourenco Baeta
(violao, viola, vocal, flute, violin)



Ouça Bicicleta



domingo, 5 de dezembro de 2010

A poesia e o homem

Costuma-se dizer que para tudo na vida existe uma razão, uma utilidade. Nada está na natureza por acaso ou “capricho dos deuses”. Tudo contribui para o equilíbrio ecológico e o homem, é claro, se encontra neste contexto.

Uma preocupação toma os curiosos de assalto, levando-os a se questionarem quanto à utilidade de inúmeras coisas ou de seres exóticos, como os animais abissais, ou não tão exóticos, como determinados insetos, por exemplo. Para que servem esses seres estranhos?

No conjunto desse contexto está a explicação para a poesia. Por que existe poesia? Eu avanço um pouco mais na indagação no sentido da arte de um modo geral. Por que existiria a música, a dança, a dramaturgia, a literatura, a pintura? E mais: a pergunta mais audaciosa seria: existiria vida sem poesia e arte em geral? Será que o homem sobreviveria sem as artes, sem a ficção?

Uma vez, numa palestra de um amigo, ouvi sobre a utilidade de muitas coisas que existem e que não sabemos bem a razão. Muitas vezes, achamos que tudo isso poderia não existir e assim facilitar nossas vidas. Ele falou sobre a utilidade da poeira como filtro solar. Nunca passou pela minha cabeça pensar em algo assim, simples, mas correto. De modo geral atribui-se à poeira apenas o incômodo da poluição que ela causa. No entanto, as partículas de poeira suspensas no ar servem de escudo refletor contra os raios solares, evitando assim, que os mesmos incidam diretamente sobre nós humanos, dizimando-nos facilmente. 

Pois é! Com a arte acontece algo parecido. A arte é como a boa poeira que nos protege da aridez do mundo. A vida ao vivo e a cores é extremamente fria, forte, difícil, árida, sofrível e quantos mais adjetivos procurarmos para expressarmos as dificuldades vividas. O homem necessita da abstração, da invenção, da interpretação dessa vida. E esse talento que ele tem de inventar e se reinventar é que o faz sobreviver e às vezes viver um pouco também. Por que não?

O mundo sem o lirismo dos poetas seria insuportável. A força que o homem tem de criar, salvando-o da dor, do tédio e do vazio é o que o faz feliz. Assim como é importante o alimento para o corpo, a poesia o é para a alma. 




quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Memória musical


As lembranças mais claras que tenho dos tempos passados são, em geral, lembranças ligadas a algum tipo de som musical.
Com as do tempo da Escola João de Camargo acontece igualmente. Alguns amigos já se surpreenderam com a minha memória especial. De fato, considero que tenha uma boa memória, porém associo essa facilidade aos recortes e filtros que todos fazemos daquilo que nos interessa. A tal da memória seletiva. A minha seleção passa, entre outros interesses, pela memória musical. É a que mais me auxilia no armazenamento das minhas lembranças.
Algumas lembranças são classificadas como memórias da pele, como aquelas que nos vêm pelo contato físico, não somente as de fundo romântico, mas tantas outras, como a lembrança de uma senha somente pelo tato dos dedos no teclado; um beijo especial de mãe ou de pai; um aperto de mão forte, etc. A lembrança passa por todos os sentidos, como o do tato, já citado, que possibilita o reconhecimento das faces amigas pelos deficientes visuais ou o do olfato, pelo cheiro do campo ou de um prato especial que marcou em algum tempo.
Uma música dos compositores Lô Borges e Ronaldo Bastos chamada “Uma canção” trata muito bem do poder de ligar alguém no espaço e no tempo. Ela fala que “uma canção tem cheiro e pode transportar uma fração de um tempo qualquer que a gente viveu num outro lugar”. Acredito que qualquer pessoa com sensibilidade mínima concordará com essa afirmação.
A memória musical guarda tanto cenas inteiras quanto frações mínimas de uma história, como as de uma ou duas notas tocadas. Até hoje, ressoa em minha memória o som das teclas de um piano, na sala Rotary, que ficava no pátio da João de Camargo. A sala havia sido um presente do Rotary Club e era separada do prédio principal da escola. D. Fernanda tocou de ouvido as notas do meu samba “Eu quero o meu enredo” que eu cantarolava para ela. É difícil descrever a alegria e a emoção de ouvir pela primeira vez o som da minha composição em um instrumento musical. A música ganhava uma beleza e uma importância que acabavam por afirmar a composição de fato. Agora era uma música de verdade. Devo a D. Fernanda essas memórias tão caras para mim.
Outro momento especialmente musical era o grupo de percussão, do qual fiz parte por pouco tempo, mas me lembro bem. O toque e o som dos pauzinhos nos arranjos criados e ensaiados pela professora Naila marcaram também minha forma de observar a música como um todo. Passei a conhecer o arranjo, a colaboração de muitos no resultado único da música apresentada: “Estrela brilhante, lá no alto mar... Olha macumbebê, olha macumbabá”. Ensaiávamos em meio a estantes de livros da biblioteca, lugar sagrado para muitos e que tinha em D. Naila a principal referência, o que tornava o lugar mais especial ainda. Era ela a grande fomentadora cultural da escola, seguida, é claro, pelos outros que estavam sempre dispostos a uma boa idéia.


quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Redações do João

Meus valores

            A maioria das pessoas agem de forma diferente para serem populares. Meus valores aparecem no texto acima. Mas, eu não estou falando que sou desse jeito para ser impressionante: sou descontraído e bem humorado. Faço bons amigos, mas outros me acham chato. Sou paquerador pra caramba, gosto de garotas, mas nunca fiquei com uma, pois sou tímido. Já gostei de umas 22 garotas. Eu sou esquisito porque eu sou agitado, tenho sangue de café. Gosto de cachorros e aranhas. Gosto de vídeo-game, skate, programas de TV do C.S.I.; gosto do Discovery Channel, da Fox, do FX, do Scy Fy, do Disney XD, da Nickelondeon etc.
            Eu sou assim. Tenho um pai legal (super legal), minha mãe é carinhosa e às vezes se estressa, minha avó é simpática, meu melhor amigo é o Daniel, gosto da Carol... Ops! Escapou. É isso. Valeu!   
    


A troca

            No dia seguinte começaram a acontecer coisas estranhas. No colégio, João chegou com uma novidade:
            _ O professor de ciências disse que amanhã vai ter teste surpresa!
Os amigos ficaram preocupados e confusos. Na hora do recreio, o Daniel disse:
            _ Aí, ô! Eu sou o cara mais medroso da escola.
Foi muito estranho, porque o Daniel sempre disse que era o mais homem macho da escola. Todas as crianças da escola falavam a verdade sempre. O Cadu revelou que era todo mandão porque queria atenção das garotas. O João disse que fazia palhaçada porque... é ... ele não sabia porque, mas a escola mudou. Os professores mudaram. Até o nome da escola mudou. De Instituto Guanabara virou: A Verdade.
            A Carol disse pro João que gostava dele e ele ficou muito feliz. Um dia, Gabriel perguntou ao Leonardo:
            _ Quanto você tirou nos testes?
            _ Zero e um.
            _ O quê? Pensei que você era inteligente.
            _ Não sou. Não gosto de estudar.
            E a palavra pulou da garganta de Leonardo:
            _ Adoro brócolis.
            Aquela era a hora perfeita pro mundo explodir.
            _ O quê?!!! Eu também!
            João sempre disse que odiava brócolis, mas ele confessou que nunca comeu.


            Por João Pedro Furriel

Em 03/11/2010


Textos produzidos a partir de propostas de temas para exercícios em sala de aula.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Disco bom

 Nascente  Flavio Venturini
1. Princesa
2. Pensando Em Você
3. Jardim Das Delícias
4. Fascinação
5. Qualquer Coisa A Haver Com O Paraíso 
6. Noites De Junho
7. Espanhola
8. Chama No Coração
9. Teu Olhar, Meus Olhos
10. Alice
11. Fantasia Barroca
12. Nascente

          
       Este disco de 1982 marcou o início da carreira solo do artista, cuja grande característica é a  sensibilidade. A poesia é outra forte referência desse trabalho, que se repetiria em toda a sua obra.
       Repleta de canções suaves, letras inspiradas e um certo clima que remete ao new age (muito em função de sua veia progressiva), é um dos melhores de sua carreira.  O disco traz as importantes  Espanhola, parceria de Guarabyra, Princesa com Ronaldo Bastos e Nascente com seu principal parceiro Murilo Antunes. Traz ainda as instrumentais  Jardim das delícias e Fantasia barroca (somente de sua autoria) e Qualquer coisa haver com o paraíso com Milton Nascimento.
       Gravado em muitos corações apaixonados, deixou saudades como na romântica Pensando em você.


Pensando em você
(Flávio Venturini e Kimura)

Meu amor, minha flor
Eu preciso estar perto de você
A todo momento
Eu já não aguento mais
Essa solidão, esse tormento
Mas no fundo, bem fundo
A saída é um poço de águas claras
Onde brilham meus olhos a procura dos seus

                                                                 
Pensando em você



segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A poesia de Adélia Prado II





Exausto

Eu quero uma licença de dormir,
perdão pra descansar horas a fio,
sem ao menos sonhar
a leve palha de um pequeno sonho.
Quero o que antes da vida
foi o sono profundo das espécies,
a graça de um estado.
Semente.
Muito mais que raízes.


Impressionista

Uma ocasião,
meu pai pintou a casa toda
de alaranjado brilhante.
Por muito tempo moramos numa casa,
como ele mesmo dizia,
constantemente amanhecendo.


Amor feinho

Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero amor feinho.


Explicação de poesia sem ninguém pedir

Um trem-de-ferro é uma coisa mecânica,
mas atravessa a noite, a madrugada, o dia,
atravessou minha vida,
virou só sentimento.


Dona Doida

Uma vez, quando eu era menina, choveu grosso
com trovoadas e clarões, exatamente como chove agora.
Quando se pôde abrir as janelas,
as poças tremiam com os últimos pingos.
Minha mãe, como quem sabe que vai escrever um poema,
decidiu inspirada: chuchu novinho, angu, molho de ovos.
Fui buscar os chuchus e estou voltando agora,
trinta anos depois. Não encontrei minha mãe.
A mulher que me abriu a porta, riu de dona tão velha,
com sombrinha infantil e coxas à mostra.
Meus filhos me repudiaram envergonhados,
meu marido ficou triste até a morte,
eu fiquei doida no encalço.
Só melhoro quando chove



Todas as posias do livro "Bagagem" de 1976



sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Coisas tão simples

Este é o mais recente disco que tem me ajudado a enfrentar o trânsito sem sentir. É possível eu ir dormir, pensando em dirigir para o trabalho no dia seguinte só para voltar à sua audição. Esse cara é um dos pilares da música moderna brasileira e de altíssimo gosto. Um exemplo é a música a seguir:


Café com Pão (Jodel) João Donato e Lysias Ênio

Coisas tão simples de nós dois
Pão com manteiga no café
Coisa com coisa que somou
Mais...
Coisas tão poucas, tão banais
Coisas com coisas tão iguais
Coisas que homem e mulher faz
Coisas de quem sabe o que quer
Somos assim, tão naturais
Como o amor dos animais
É...
Coisa que a gente nem deu nome
E de manhã, aquela fome
O nosso cheiro nos lençóis
Nós...


quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Boas lembranças


A chuva molhou as lembranças, há muito, secas
Da mudança de tempo, o que mais gosto é do cheiro
Cheiro de terra molhada, de pingos no telhado, de roça
Da imagem, o que vem são os barquinhos de papel

Navegando até virarem a esquina do beco
Do som, a voz da mãe: _menino entra pra dentro!
Chover é bom, mas o medo são os raios
Eu sempre gostei do lá fora, da rua, das fugas... 
_Mãeee, já volto!
Do cordel de lembranças, as boas eu encharco.
As más, eu passo a ferro e guardo

Assis Furriel

Inspirado no poema “Varal” de Eliana Pichinine e em Adélia Prado.
Link para o poema Varal

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O Moderno Noel Rosa


Considerado por muitos um fenômeno por seu legado, é fácil compreender essa magnitude. Sua obra conta 259 composições em vinte e seis anos de vida e sete de atividade musical. Moderno, espirituoso e com um grande senso de humor, compôs e cantou a alegria, a dor, o cotidiano urbano, as paixões, as traições, as agruras do amor em sambas, marchas e outros ritmos. Segundo Jairo Severiano (pesquisador da música popular brasileira), Noel foi “o primeiro artista que logo se projetaria como compositor e letrista, renovador de nossa lírica e cujos versos permaneceriam como exemplo de poesia popular”.

Noel Rosa era um artista de vanguarda e compôs temas que traduziam as tensões geradas pela modernidade, como no samba Não tem tradução, no qual fala da influência da língua estrangeira no morro com a chegada do cinema falado: “(...) Essa gente hoje em dia/ que tem a mania da exibição/ Não entende que o samba não tem tradução no idioma francês/ Tudo aquilo que o malandro pronuncia/ Com voz macia é brasileiro/ já passou de português/ Amor lá no morro é amor pra chuchu/ As rimas do samba não são I love you/ E esse negócio de alô, alô boy e alô Johnny/ Só pode ser conversa de telefone”. Às vezes, unia numa mesma música referências dos mundos do morro e da elite, revelando as possíveis relações entre diferentes camadas sociais, como no samba Cem mil réis (Noel e Vadico): “Você me pediu cem mil réis/ Pra comprar um soirée e um tamborim/ O organdi anda barato pra cachorro/ E um gato lá no morro/ Não é tão caro assim/ Não custa nada/ Preencher formalidade/ Tamborim pra batucada/ Soirée pra sociedade (...)”.

Noel compôs com quase todos os bambas do seu tempo, entre eles Ismael Silva, Cartola, Orestes Barbosa, Kid Pepe, André Filho, Ary Barroso, Hervê Cordovil, Heitor dos Prazeres, João Mina, João de Barro e Lamartine Babo. Entre seus muitos intérpretes, destacam-se Marília Batista e Araci de Almeida.

De todos os parceiros, o que marcou mais a sua carreira foi Osvaldo Gogliano, o Vadico. Músico de esmerada educação musical, vindo de São Paulo, estava iniciando carreira profissional no Rio, quando conheceu Noel no final de 1932. A primeira parceria rendeu, talvez o maior clássico, Feitio de oração: “Quem acha/ Vive se perdendo/ Por isso agora/ Vou me defendendo/ (...) Batuque é um privilégio/ Ninguém aprende samba no colégio/ (...) O samba na realidade/ Não vem do morro/ nem lá da cidade/ E quem suportar uma paixão/ Sentirá que o samba então/ Nasce no coração”.

Noel de Medeiros Rosa viveu apenas 26 anos. Nasceu em 11 dezembro de 1910 e morreu em 4 maio de 1937. Parece viver até hoje, por sua obra marcante e contemporânea.



Alguns links para curtir o poeta:

Com que roupa? - Noel canta
Gago apaixonado - Noel canta
Palpite infeliz - Com João Gilberto

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ivan Lins & The Metropole Orchestra

        No momento, é o disco que tenho ouvido no carro. Neste trabalho, Ivan Lins apresenta versões sinfônicas para canções como “A Gente Merece Ser Feliz”, “Começar de Novo”, “Lua Soberana”, "Ai, Ai, Ai, Ai, Ai" entre outras. Fica aqui a sugestão para  a versão de "Arlequim Desconhecido", que para mim é a melhor.





sábado, 6 de novembro de 2010

Os sonhos não envelhecem – Histórias do Clube da Esquina


 Falar da beleza desse livro e do autor maravilhoso que é o Marcio Borges é falar também de um tempo e de algumas vivências que experimentei à época da minha leitura do livro. Era o ano de 1997 e eu estava com toda a sonoridade do disco Nascimento (até então, o mais recente trabalho do Milton), que pra mim era uma espécie de retomada do espírito de seus discos dos anos 70. Além disso, tinha acabado de voltar de uma viagem que fiz com minha esposa Rita e um casal de amigos às cidades históricas mineiras. Estava encharcado de todas aquelas impressões barrocas e também da capital Belô, na qual havia estado um pouco antes numa visita que Rita e Eu fizemos a um amigo nosso, neste mesmo ano. De modo que, estava pronto para embarcar nos sonhos que não envelhecem.

O livro “Os sonhos não envelhecem – Histórias do Clube da Esquina”, cujo título remete a uma frase da música Clube da Esquina n°2: "Porque se chamavam homens/ Também se chamavam sonhos/ E sonhos não envelhecem" (de Lô Borges, Marcio Borges e Milton Nascimento), é uma sucessão de memórias do autor, que narra em primeira pessoa e que se revela na grande personagem da história, embora toda a narrativa gire em torno da figura central de Milton Nascimento. O livro conta a história do importante movimento musical mineiro chamado “Clube da Esquina”, revelado para o grande público a partir do disco “Clube da Esquina” de 72, no qual Milton Nascimento divide a autoria com o jovem Lô Borges (irmão de Marcio) e que tem a participação de uma galera enorme, bem ao estilo gregário dos anos 70. Ali apareceram não somente Lô, como Beto Guedes, Toninho Horta entre outros músicos maravilhosos.

A meu ver, a grande e agradável surpresa do livro foi descobrir essa pessoa linda e sensível que é o Marcio Borges. Não é a toa que é ele um dos principais poetas do Clube. Mais que uma história de artistas geniais vivida no auge de sua criatividade, o livro é uma declaração de amor do autor a um amigo muito querido. Um amor fraterno de um menino sensível, que descobre a vida ao mesmo tempo em que descobre a amizade sincera. É um encanto descobrir essa relação à medida que a leitura avança, como quando da criação da parceria (anterior ao próprio Brant) influenciados pelas várias sessões seguidas de Jules et Jim, de François Truffaut, que Marcio apresenta ao amigo. Ficaram tão inspirados com o clássico que saíram dali direto para o “quarto dos homens” da casa de D. Maricota e Seu Salomão (pais dos Borges) e começaram a compor aos borbotões. São desse momento canções como Paz do amor que vem (Novena), Gira-Girou e Crença, tudo como diz o próprio autor “sempre acabando devidamente comemorado por nós dois com muita batida de limão no Bigodoaldo’s”. Esses eventos etílicos, inclusive, acabaram narrados em “Viola, violar”, composição da dupla em “Milagre dos peixes”, gravado ao vivo em 1974: “Violar vinte fracassos de mudar de tom/ Vinte morenas para desejar/ Vinte batidas de limão”.

A intenção desse prefácio é a de observar essa atmosfera criada pelo autor a partir do seu talento muito influenciado pelo cinema. Acredito que sua experiência com o filme do Truffaut, ainda muito jovem, o fez quedar para uma narrativa mais cinematográfica. Tem-se a impressão de estar vendo um filme. Um filme tão emocionante quanto aquele que o inspirou.

No final do livro, no seu posfácio escrito pelo próprio Bituca, este conta que numa passagem por Nova York, foi levado de surpresa por um amigo ao encontro da atriz Jeanne Moreau, a sua musa de Jules at Jim. Milton conta que tremeu diante da já senhora atriz. Depois de ouvir a história do músico, a atriz lhe disse: “Como é bela a arte, Milton. Trabalhamos numa coisa aqui e vamos tocar a alma de quem nem sabemos e nem onde. Ontem fui eu, Truffaut e agora é você. Que lindo e que responsabilidade”.

Emocionei-me muito nesta passagem como em muitas outras, e sempre que quero me sensibilizar, retorno ao livro que já li várias vezes. Assim que terminar umas leituras obrigatórias, lerei novamente para que os meus sonhos continuem vivos e jovens.
           
Clube da Esquina nº2
(Milton Nascimento, Lô Borges e Marcio Borges)




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quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A poesia de Adélia Prado

Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
(dor não é amargura).
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Do Livro "Bagagem" de 1976, inspirado em "Poema de sete faces", de Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

domingo, 31 de outubro de 2010

O bonde da história




Ainda sob os efeitos das pesquisas que realizei para o trabalho de conclusão do curso de história, quero falar do bonde, meio de transporte largamente utilizado desde a segunda metade do século XIX até os anos 1960. No Rio de Janeiro, o bonde foi extinto no ano de 1968, ficando apenas o de Santa Tereza como prova desse marco histórico, em funcionamento até hoje. Pelo seu apelo natural, o tema era muito abordado, quer na literatura quer na música popular. Afinal, era nesse meio de transporte que a população se apertava no seu ir e vir diário e desse convívio saíam muitas histórias interessantes.

O bonde foi uma conquista moderna na área do transporte, sobretudo o elétrico, surgido no final do dezenove. Uma crônica[1] sem título de Machado de Assis conta a história da chegada do bonde elétrico. Ele se impressiona com a altivez do condutor do bonde elétrico que passa por ele que estava em um movido a tração animal: “O que me impressionou, antes da eletricidade, foi o gesto do cocheiro. Os olhos do homem passavam por cima da gente que ia no meu bond, com um grande ar de superioridade. (...) Sentia-se nele a convicção de que inventara, não só o bond elétrico, mas a própria eletricidade”. A crônica é de 16 de outubro de 1892 e apresenta o diálogo dos animais que puxam o bonde antigo. Na conversa, reclamam da vida e falam do medo do desemprego e da desesperança do fim de carreira. Machado humaniza esses personagens, revelando preocupações típicas do homem diante das inovações que sempre trazem as inseguranças quanto ao futuro. Um dos burros argumentava que a tração elétrica, desde que estendida a todos os bondes, seria a senha para a sua liberdade. O outro contra argumentou que o colega não conhecia bem a história da espécie, obviamente, entendendo que a tradição do jugo imputado pelo homem trataria de arranjar outras ocupações para os pobres. 

Na música da primeira metade do século XX, foi uma grande fonte de inspiração para que episódios cotidianos ganhassem destaque nas rimas do samba. A famosa e competente parceria de Wilson Batista e Ataulfo Alves produziria um dos clássicos mais famosos dos anos 1940: “O bonde de São Januário”, que introduziu o tema no contexto político da época. A apologia ao trabalho estava em alta com o Estado Novo, portanto, “a boemia não dá camisa a ninguém, quem trabalha é que tem razão”. “O bonde São Januário/ Leva mais um operário/ Sou eu que vou trabalhar”. Em outro samba, "E o 56 não veio...", o mesmo Wilson e Haroldo Lobo retratam o amor e o desencontro: “Eu ontem esperei às sete em ponto/ Ainda dei uma hora de desconto/ Os ponteiros do relógio pareciam me dizer/ Vai embora meu amigo/ Ela não vai aparecer/ Será que ela não veio por que se zangou/ Ou o bonde Alegria descarrilou”.



Imagens do Bonde ao som de "Palpite infeliz" de Noel Rosa
na voz de João Gilberto



[1] Disponível em ASSIS, Machado de. Crônica (107) / A Semana / 1892. In: COUTINHO, Afrânio (org.). Obra Completa. Vol III. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985.



  

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Conversa sobre notas e cafés


Para Guilherme um grande interlocutor (in memorian)




_Café para dois, por favor!

Quando foi nosso último café?
Não me lembro
E nós que ficamos, por várias vezes, de marcar um outro...
Lembro-me bem do primeiro.

Ficamos, de fato, sem tempo.
Combinamos uma nova classe.
Quem sabe numa transversal de um tema interessante
Eram muitos temas assim, de comum interesse.
Tudo te interessava.
E a mim, me interessava te ouvir.

Me ocorre agora que... - Opa! Essa fala é sua -
Com licença poética vou usá-la em sua homenagem.
Me ocorre que sua sede de saber, de erudição e tal,
Sei bem como começou: a nota do Borges.
Não o Jorge Luis, o Edson. Aquele dá textos, este dá notas.
Notas dificeis, notas suadas, trabalhosas...

Lembro-me como te incomodou.
É daí o primeiro café e tantos outros cujos temas foram as notas.
Viraram uma obssessão as boas.

Que mal te fez a nota baixa!
Abaixo da crítica. Da sua crítica. Da minha também.
Não me lembro quanto foi: 5, 4, 3 não sei bem ao certo.

Ele sabe. O das notas!

Que bem te fez a nota!
Tua indignação, tua raiva te redimiram.
Teu brio te elevou e muito.
Vem daí meu respeito por ti.

Santo Borges!
Santa NOTA!

...............................................................

Mas afinal, me ocorreu... Opa! Perdão.
Que esse diálogo é apenas um desejo.
Carece de dois.

Me ocorre também que sua xícara está cheia e o café esfriou.
Vou-me embora.
Odeio monólogos!

Por Assis Furriel (Francisco)

Simples Delírio

                                        (para Juiz de Fora)
           

De repente pegar a estrada

E deixar rolar o prazer

Entrar cantando num mundo mais limpo, voltar!

E sentir os meus com saudade

Com vontade de falar, conversar coisa à toa

Subir ladeira, vontade de chegar

Nas calçadas, as flores

Nas casas, o gosto do campo

Gosto de fruta madura

Comer sem parar o tempero mineiro

Viver sem noção das horas

Tocar com os amigos

Caminhar pelas ruas de lá

Fazer do nada uma suave surpresa!


(Assis Furriel/Luiz Cláudio)