quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O Futebol de Chico Buarque na análise de um fã



A estética maravilhosa do futebol brasileiro pode ser contemplada na letra de O Futebol, música de Chico Buarque, compositor apaixonado por esse esporte que apresenta várias formas de encantamento. O futebol é um
jogo, mas quando bem jogado é arte. E é desse futebol de excelência que quero falar. Qualquer fã apaixonado pelo esporte da bola no pé percebe essa beleza, ou mesmo a espera, ansiosamente, desde o apito inicial. O bom torcedor quer a vitória sempre, mas se possível com arte, pois a vitória é obrigação e a arte é o deleite, é o prazer.

Em O Futebol, Chico dá uma de Armando Nogueira da música e traduz, maravilhosamente, a capacidade que o craque brasileiro tem de fazer do esporte uma arte também. O autor faz uma homenagem aos seus craques preferidos (dos tempos em que ainda sonhava em ser um), imaginando uma linha de passe, que não chegou a existir no seu conjunto, entre Mané Garrincha, Didi, Pelé, Pagão e Canhoteiro.

Na música, Chico confessa os “desejos de craque”, como quando no início, diz que para estufar o filó (rede), num chute sonhado, só se fosse o Rei (Pelé – Edson Arantes do Nascimento). Diz que uma “firula exata” (algo como um drible, um jogo de corpo, um vai, mas não vai) mereceria uma placa exposta em um museu, como uma pintura. Em: “Pintura mais fundamental que um chute a gol com precisão de flecha e folha seca”, Chico faz uma homenagem a Didi (Valdir Pereira), craque da seleção campeã de 1958, que criou o famoso chute batizado de “folha seca”. A razão do nome é que o chute tinha o efeito de percorrer uma trajetória e cair, repentinamente, como uma folha seca. Quando se refere a Garrincha (Manoel Francisco dos Santos), o autor usa a imagem de um parafuso, lembrando que o Mané gostava de girar com a bola ao redor do seu marcador (um João qualquer) pela lateral do campo e quando ameaçava uma finta (drible) que não se concretizava. Canhoteiro (José Ribamar de Oliveira) era lateral de grande habilidade, como Garrincha, só que jogava pela esquerda. Foi craque do São Paulo nos anos 1950, fazendo parte também da seleção brasileira e só não foi à copa de 1958 pelo enorme medo de avião que tinha. Chico Buarque nunca o esqueceu. Pagão (Paulo César Araújo), outro craque da época, também era admirado pelo menino Chico, era centroavante e jogou ao lado de Pelé e Pepe no Santos.

O artista vê o gramado como um tabuleiro, imaginando uma série de desenhos geométricos. Assim, se vê na “vaga geometria”, o corredor, uma paralela rente a linha lateral (quase impossível), como se o craque encontrasse espaço aonde não havia. Revela o sentimento do homem-gol (o artilheiro) que, imaginariamente, rasga o chão e depois o costura, num zig-zag de dribles até o tento final. Descreve a parábola de um homem comum como um “chapéu” (ou “lençol”) e refere-se aos estádios como coliseus modernos onde a galera delira diante de movimentos majestosos.

O futebol precisa de craques dentro das quatro linhas, mas precisa também de outros craques para que fora delas façam a resenha com a mesma majestade. O esporte perdeu o menino Chico, mas ganhou um craque-poeta; para nossa felicidade!

O Futebol (Chico Buarque)


Para estufar esse filó/ Como eu sonhei/ Só se eu fosse o Rei/ Para tirar efeito igual ao jogador/ Qual compositor/ Para aplicar uma firula exata/ Que pintor/ Para emplacar em que pinacoteca, nega/
Pintura mais fundamental/ Que um chute a gol/ Com precisão de flecha e folha seca/
Parafusar algum joão na lateral/ Não quando é fatal/ Para avisar a finta enfim/ Quando não é
Sim no contrapé/ Para avançar na vaga geometria, o corredor/ Na paralela do impossível, minha nega
No sentimento diagonal do homem-gol/ Rasgando o chão e costurando a linha/ Parábola do homem comum
Roçando o céu/ Um senhor chapéu/ Para delírio das gerais no coliseu/ Mas Que rei sou eu
Para anular a natural catimba do cantor/ Paralisando esta canção capenga, nega/ Para captar o visual
de um chute a gol/ E a emoção da idéia quando ginga/ (Para Mané/  para Didi para Mané/ Mané para Didi/ para Mané/ Para Didi para Pagão para Pelé e Canhoteiro)



6 comentários:

  1. Olá amigo,

    Muito bom o artigo e amei relembrar a música do Chico!!!
    Abraços mil!!!

    Deise Puga

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  2. muito o brigado por posta uma analise da musica, eu tinha um trabalho falando sobre esta musica ai lir esta analise e teve varias ideas para minha redação muito obrigado e tambem gosto das musicas de chico buarque

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  3. Que bom que gostou! Legal poder ajudar com aquilo que escrevemos por prazer. Boa sorte na redação!

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  4. Essa música é sensacional, tanto letra quanto musicalidade... Alguém saberia informar quem compôs o arranjo da música????
    Valew

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  5. Caro amigo(a) anônimo,

    o arranjo desta versão apresentada no link é de Luiz Claudio Ramos. Músico, maestro e arranjador, acompanha o Chico até hoje, desde um bom tempo. O disco, inclusive, é de 1989. Portanto, já tem 22 anos. Você tem razão, ela é toda linda, letra, melodia e arranjo.

    Vai aqui a ficha técnica completa da gravação:

    O Futebol:

    Violão, guitarra e sintetizador: Luiz Claudio Ramos
    Piano e teclados: Hugo Fattoruso
    Baixo: Luizão
    Bateria: Robertinho Silva
    Percussão: Wilson das Neves e Robertinho Silva
    Arranjo: Luiz Claudio Ramos

    disponível em: www.chicobuarque.com.br

    Veja links ao lado, neste blog.

    Abraço e obrigado pela participação!

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  6. O jogo de cintura, tanto da letra quanto da melodia e do arranjo, tão peculiares quanto o esporte em si, nos transmite aquela sensação do vai-não-vai e no final é só festa... GOOOOLLLL!!! Sou apaixonada por Chico Buarque!
    Parabéns Assis! Aumentar meus conhecimentos através das suas análises tão pitorescas, da sua cultura geral que aprofunda o nosso ser, cria raízes e me faz imensamente feliz! Muito obrigada por compartilhar essas preciosidades conosco!
    DEISE CORDEIRO CANDREVA

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