quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Apontamentos sobre Marc Bloch e Lucien Febvre


Por Assis Furriel

A visão de Peter Burke sobre os Anais

Marc Bloch
Peter Burke propõe, a partir de seu livro “A Escola dos Annales (1929-1989): A Revolução Francesa da Historiografia”, uma analogia desta “revolução” (a criação da Escola dos Anais por Marc Bloch e Lucien Febvre) com a acontecida no final do século XVIII. Por vários motivos é fácil compreender a comparação. Vejamos três aspectos importantes para melhor visualizar o que pensa Burke. Primeiro, ambas aconteceram na França; segundo, apresentaram uma ruptura com uma tradição vigente na época; terceiro, mudaram o modo de ver e de ser tanto na Política quanto na História, na França e no Mundo.

Lucien Febvre
Com a Revolução Francesa, em 1789, o absolutismo foi extinto. O regime no qual o rei governava absoluto, também chamado Antigo Regime, acabara dando lugar a uma nova forma de governo e inaugurando a contemporaneidade. De certo modo, somos herdeiros de uma série de conquistas políticas e democráticas que se originou desta época. O inglês Peter Burke, um importante teórico da historiografia, interpretou o surgimento da Revista dos Annales como sendo uma verdadeira revolução da disciplina História. “Para interpretar as ações dos revolucionários, contudo, é necessário conhecer alguma coisa do antigo regime que desejavam derrubar.” (Burke, 1997; p. 17). Esta passagem, logo no início do capítulo 1, demonstra o quanto o autor considera tudo que se fazia em termos de história, até então, era absolutamente diferente da proposta trazida por Bloch e Febvre.

O estilo historiográfico que imperou no século XIX, com exceção de alguns autores, era de inspiração positivista. De modo, que cada campo do conhecimento cuidava separadamente da sua área. Com o discurso da cientificidade, a necessidade de dar essa marca científica a História, desenvolveu-se métodos que davam “legitimidade” às pesquisas e às obras. Dessa forma, a opção pela história política, dos heróis, dos vencedores era a história “oficial”. Foi dada uma relevância maior pelas fontes escritas, pelos documentos em detrimento da história oral e das particularidades.

A Escola dos Annales rompe com essa tradição, inovando no modo de escrever a história, elencando uma série de possibilidades de recortes históricos. Seus participantes passam a se utilizar dos outros campos do saber, como a sociologia, a psicologia, a antropologia etc., para construir ou reconstituir a história, não só dos acontecimentos maiores como do modo de vida comum dos indivíduos. 


A história problema de Marc Bloch 

O problema encontrado por Bloch é justamente a percepção de que apenas uma categoria de investigação não daria conta de explicar um fato histórico. Em seu estudo sobre os reis taumaturgos, se utiliza de outras modalidades, como a sociologia e antropologia, por exemplo, mas não considera suficiente para explicá-lo por si só. Utilizando-se do método comparativo, não considera a transposição de casos, como ideal para as particularidades: “o método comparativo é extremamente fecundo, mas desde que não saia do geral; não pode servir para reconstituir os detalhes.”


O positivismo em Bloch 

Assim como aconteceu na época da Revolução Francesa, quando muito dos hábitos e da tradição da época do “Antigo Regime” não se rompeu e permaneceu nos modos, nas mentes de muita gente, com a “Revolução dos Annales” também se deu assim. Muito dos aspectos positivistas do século anterior ficou. E porque não dizer: até hoje somos herdeiros de um modo político de estar no mundo. Com Bloch e Febvre também foi assim. Diferente de Burke, precisamos notar nas permanências que se fazem presentes na vida cotidiana. Embora, tenha sido mesmo uma revolução, a Escola traz consigo a marca do desprendimento. O mais importante é a questão. Influenciado pelo sociólogo Émile Durkheim, utiliza-se também dos métodos tradicionais quando o convém. Não quer romper completamente com o estabelecido, quer apenas fazer diferente. Quando escolhe escrever sobre a crença sobre o poder de cura dos reis é ainda sobre os líderes que se interessa e não sobre os populares ou sobre as mulheres curandeiras que poderiam existir, por exemplo. Sua preocupação com as fontes não deixa de ser também uma referência a uma preocupação do modo positivista da pesquisa. 


Bloch e Febvre e seus métodos 

Bloch e Febvre eram muito diferentes no modo ser, porém seus interesses por uma História livre lhes deram condições de trabalharem juntos. O interesse pela interdisciplinaridade foi o ponto de partida. Ambos tinham tido a experiência da convivência, desde a academia, com grandes expoentes das varias áreas das ciências humanas. Contudo, se o compromisso de Bloch fosse mais com a sociologia, Febvre se valia mais da geografia. Ambos pensavam a História a partir de uma perspectiva de uma história-problema. Para os dois, cada indivíduo faria seu recorte histórico de acordo com seu interesse. Como por exemplo, uma determinada época e suas características serão estudadas segundo o desejo daquele que se debruçar sobre o tema. Aí a questão da subjetividade falará mais forte. Desse modo, um economista, um sociólogo, um psicólogo etc. olharão para um mesmo fato histórico e tirarão conclusões de acordo com seus interesses. 





Um comentário:

  1. Assis,

    Este é um dos privilégios da vida: pensar e refletir agregando informações durante a vida.

    Beijão!

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